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domingo, 19 de junho de 2016

Celulares e câncer


O uso de telefone celular causa câncer? Esta é uma pergunta recorrente que sempre volta a agitar os meios de comunicação quando um estudo traz nova informação.

Até agora o que tínhamos era que não existiam evidências convincentes que mostrassem uma relação entre o uso de celulares e qualquer aumento na incidência de câncer. Essas informações surgiram de estudos importantes como o Million Women Study realizado no Reino Unido em 2013 e outro com mais de 350 mil usuários de telefone celular na Dinamarca, publicado em 2011. O primeiro concluiu que 


“... o uso do telefone celular não foi associado a um aumento da incidência de glioma, meningeoma ou câncer fora do sistema nervoso central”. 

Já o estudo dinamarquês...


“... não houve aumento do risco de tumores do sistema nervoso central, oferecendo pouca evidência para uma associação causal.”. 

Ainda, para corroborar a ideia de falta de associação entre telefone celular e câncer, dados nos Estados Unidos indicam que a incidência dessa doença no cérebro se mantêm inalterada desde 1992 pese ao uso intenso da telefonia móvel nos últimos anos.

Todos sabemos que alguns tipos de radiação causam câncer. Raios X, luz ultravioleta, a radiação das armas nucleares -entre outras-, têm a capacidade de ionizar átomos ao remover seus elétrons e isso está associado a dano no DNA, o que pode levar ao surgimento de câncer. Mas a radiação produzida por celulares (radiação de radiofrequência, RRF) não é ionizante, o que a diferencia das outras citadas acima, e não existem evidências consistentes que indiquem danos associados a este tipo de radiação.

Por isso a comunidade científica recebeu com bastante ceticismo os resultados de um estudo recém-publicado que mostram que a RRF provocou tumores em animais. O estudo foi realizado pela National Toxicology Program, uma agência oficial norte-americana que analisa riscos toxicológicos. Ratos foram expostos desde antes do nascimento até a idade de dois anos (nove horas por dia, todo dia) a diferentes níveis de radiação do tipo da emitida por telefones celulares. Finalizado esse período os animais foram analisados em relação ao aparecimento de algum tipo de dano. Os pesquisadores observaram que entre dois a três por cento dos animais expostos (três em 90 analisados) desenvolveram glioma maligno, um tipo de câncer cerebral, contra zero casos (0/90) em animais do grupo controle. Além do mais, entre cinco a sete por cento dos animais expostos às radiações mais intensas desenvolveram tumores no coração, especificamente nas células que envolvem as fibras nervosas cardíacas (schwannomas). 

O estudo causou muita dúvida entre cientistas por vários motivos. Chamou a atenção que essas alterações quase não foram detectadas em fêmeas. Por outro lado, o fato de zero animais controle apresentarem gliomas é bem estranho. Estudos anteriores mostraram que o aparecimento desse tipo de câncer em animais controle é ao redor de 2%. Se isto tivesse acontecido com o estudo atual não haveria diferenças em relação ao grupo exposto à radiação. Schwannomas podem ocorrer em vários órgãos, mas neste estudo ocorreram só no coração, por quê? Finalmente, os animais submetidos à radiação embora tivessem um índice maior de tumores viviam mais que os animais controle. Nenhuma dessas questões apresentaram respostas, o que leva a questionar a metodologia utilizada no estudo.

E agora? Bom, o estudo está aí e as críticas científicas também. Se bem os pesquisadores encontraram essas diferenças, elas não foram significantes desde o ponto de vista estatístico. Ainda, os estudos anteriores feitos em humanos não revelaram um aumento de câncer no cérebro ou tumores no coração. E ainda, não temos uma explicação para uma eventual interferência da RRF em sistemas biológicos que possam levar a esses resultados. Mesmo assim, como vivemos num ambiente onde somos constantemente bombardeados pela RRF, estudos como estes são necessários. Que ainda não saibamos como essa radiação possa nos afetar não significa que ela eventualmente não nos afete. 

 E lembrar, claro, que se celular não mata via câncer, sim o faz pelos mais de 1,3 milhão de acidentes de trânsito (só no Brasil) causados pelo seu uso enquanto estamos dirigindo. Esse, por enquanto é o real problema, e bem fácil de solucionar.