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sábado, 9 de abril de 2016

Alfinetando a acupuntura

Foto: Janine Wiedel/Alamy (The Guardian)
Popularmente falando, se há um mar onde a acupuntura nadava de braçada, era o mar da dor nas costas. De fato, meus amigos acupunturistas tinham me convencido que se bem essa terapia não era a panaceia que se comentava por aí -servindo para praticamente tudo quanto é doença- no caso da dor lombar e ciática era bem eficiente. Alguns estudos científicos atestariam inclusive essa eficácia.

Sempre duvidei desses estudos. Geralmente eram realizados por especialistas adeptos à acupuntura, o que me deixa com um pé atrás porque sei como nosso cérebro é capaz de distorcer a realidade e adaptá-la, consciente ou inconscientemente, ao nosso sistema de crenças (isso se aplica a tudo, ciência, política, religião, etc.). Mas a ideia que as agulhadas melhoravam a dor já estava bem assimilada por mim. E não apenas por mim, claro. O sistema de saúde do Reino Unido (NIH), entre outros, tinha recomendado em 2009 que nos casos de dor lombar e ou ciática, a realização de no máximo 10 sessões de acupuntura por um período de até 12 semanas seria uma conduta recomendável. Mas ao que parece de lá para cá a coisa mudou, a ponto de nas novas diretrizes de 2016 o mesmo NIH recomenda agora "Não oferecer acupuntura para controlar a dor lombar não específica com ou sem ciática.".

De acordo com o Professor Mark Baker, diretor de prática clínica do NIH, “Infelizmente, há uma falta de provas convincentes de eficácia para alguns tratamentos amplamente utilizados. Por exemplo, a acupuntura não é mais recomendada para controlar a dor lombar com ou sem ciática. Isso ocorre porque não há provas suficientes para mostrar que é mais eficaz do que o tratamento placebo ".

E é aí que está o cerne da questão. O que levou a essa mudança? Outra declaração do NIH nos dá uma pista “Embora a comparação da acupuntura com os tratamentos habituais demonstrou melhorias na dor, função e qualidade de vida a curto prazo, a comparação com a acupuntura sham não mostrou nenhum efeito clinicamente importante e consistente."

Esta afirmação se refere à análise criteriosa de estudos científicos publicados nos últimos anos comparando a efetividade da acupuntura real não com tratamentos convencionais e sim com a acupuntura sham (ou falsa acupuntura). Na acupuntura sham o paciente acredita (neste caso acreditar é fundamental) que está sendo tratado de fato com a acupuntura real, mas as agulhas são introduzidas em qualquer ponto do corpo (propositalmente fora dos famosos acupontos), ou ainda é utilizado um tipo de agulha que parece penetrar na pele, mas de fato não penetra. A acupuntura sham é utilizada em estudos científicos para testar a real eficácia de acupuntura. Se o resultado do tratamento com acupuntura sham for estatisticamente similar ao tratamento com a acupuntura real, então o efeito desta última é muito provavelmente devido à sugestão e ao efeito placebo. Se, ao contrário, estatisticamente a acupuntura real funciona melhor do que a sham, então isso poderia indicar que outros mecanismos fora a sugestão e o efeito placebo estão agindo (mais detalhes aqui). De acordo com o NIH, o que os estudos indicaram -e daí a decisão- é que a acupuntura real não é superior à sham na melhora das dores lombares acompanhadas ou não por dor ciática.

Além de descartar a acupuntura, a nova diretriz contraindica a utilização do paracetamol como opção inicial para tratamento desse tipo de dor e recomenda anti-inflamatórios não esteroidais como os derivados do ácido acetilsalicílico e ibuprofeno (sempre com orientação médica, claro).

É isso. Particularmente acho que esses resultados indicando que a acupuntura quando funciona o faz via efeito placebo e autossugestão, fazem todo o sentido. Até hoje não encontramos mecanismos de ação convincentes. Sua base conceitual repousa em conceitos da filosofia chinesa como o Yin e Yang, forças cósmicas como o Qi percorrendo canais ou meridianos em nosso corpo. Embora respeitáveis dentro do contexto da tradição chinesa, esses conceitos não têm sustentação científica, sendo considerados por vários pesquisadores apenas como uma pseudociência, não muito diferente da astrologia e a homeopatia.

Dito isto, na minha opinião se algum paciente encontra alívio ao seu sofrimento utilizando acupuntura, seja via efeito placebo ou não, deveria continuar seu tratamento, sempre e quando este não ofereça um perigo potencial maior ou o faça adiar tratamentos reconhecidamente efetivos. O que deveríamos avaliar é se tratamentos que funcionam via efeito placebo deveriam ser incluídos em nosso depauperado sistema de saúde. Mesmo por que, oferecer pelo SUS uns e proibir outros não faz muito sentido. Por que deveríamos deixar de fora o uso de cristais, imposição de mãos, urinoterapia, florais de Bach e tantos outros?

7 comentários:

  1. Se a acupuntura em se não funciona, o que poderia funcionar na falsa acupuntura? Dizes que a falsa acupuntura e a verdadeira acupuntura funcionam da mesma forma, sendo prioridade para este tratamento que a pessoa tratada tem que acreditar na acupuntura e achar que está sendo tratada com esta. É simplesmente um ritual que deve ser aceito, e sendo assim produz o mesmo efeito, fazer-lo da forma convencional ou não, no caso com agulhas ou não. Ao ponto de que, ao verem que pode produzir efeito de qualquer forma, hoje em dia, acreditem se quiserem (ou melhor, procurem na internet) tem pessoas que se oferecem em fazer acupuntura pelo telefone, e para piorar as coisas, tem gente que acredita que funciona.
    Ou seja, que a acupuntura “funciona” com a punção de agulha no lugar supostamente certo; com punção de agulha num lugar errado; com a idéia de punção de agulha no lugar certo ou no lugar errado; e sem agulha alguma, sendo guiado por um “expert”que consegue fazer sentir a punção em algum lugar do corpo que supostamente possa trazer o beneficio procurado pelo incauto paciente. Sendo assim, só o fato de saberem que existe a acupuntura deve lhes outorgar bem estar e satisfação.

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    1. A acupuntura pelo telefone não conhecia. Daqui a pouco Vivo, Tim, etc., vão disputar qual tem o melhor sinal para permitir um Qi mais eficiente :)
      Fora a brincadeira, parece ser mais o menos o que vc menciona, o importante é o que o paciente acredita. Nos estreitos limites de cura da auto-sugestão, esta pode ser eficiente.
      Abraço e obrigado, como sempre, pela visita.

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  2. Excelente texto!!!! Parabéns!!!!!!!!! :D

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  3. Uma breve historia da acupuntura.
    O ser humano conseguiu produzir agulhas tão finas de aço, como as usadas na acupuntura, há aproximadamente quatrocentos anos, ou seja, a acupuntura no estado atual é moderna. Anteriormente eram usadas agulhas grosas e ao principio pedras e até lanças.
    O livro mais antigo que descreve a acupuntura é: “Princípios da medicina interna do imperador amarelo” de Huangdi Neijing do ano 100 e.c..
    Segundo Paul Unschuld, sinófilo historiador, a idéia de acupuntura poderia ter-se originado na Grécia Hipocrática e haver sido importada para China mais tarde, ou seja, se Hipócrates morre aproximadamente no ano 370 a.e.c., a acupuntura não tem mais de três mil anos, nem é chinesa. (Paul Unschuld, sócio fundador de Horst-Goertz-intitute, de teoria, historia e ética de ciências da vida chinesa, Universidade de Medicina de Berlim)
    Um artigo de revista científica afirma que a ausência de qualquer menção de acupuntura em documentos encontrados na tumba de Ma-Wang-Dui de 198 a.e.c., sugere que a acupuntura não foi praticada neste tempo. (White, A.; Ernst, E. (2004). "A brief history of acupuncture". Rheumatology, Oxford, Inglaterra )
    Em 1683, um médico holandês, descreve à acupuntura sem nomear pontos específicos e comenta sobre grandes agulhas que se cravam no crânio e são deixadas aí durante trinta respirações. ( Willelm tem Rhijn, Dutch East India Company [Compania da Indias Orientais], ensaio "De acupuntura “, em latim). Nesta época começa a se falar em acupuntura no occidente.
    Em 1757, na china, a acupuntura é determinada como “arte perdida”, declínio este determinado pela popularidade de prescrições médicas e medicamentos e por ser associado às classes mais baixas. (Gwei-Djen Lu; Joseph Needham. Celestial Lancets: A History and Rationale of Acupuncture and Moxa, October 25, 2002).
    Em 1822, o imperador chinês assinou um decreto excluindo a prática da acupuntura do Instituto Médico Imperial alegando impróprio para cavalheiros eruditos. (White, A.; Ernst, E. (2004). "A brief history of acupuncture". Rheumatology, Oxford, Inglaterra )
    Na China foi considerada cada vez mais associada à classe baixa e analfabeta, onde foi banida em 1929 em favor da medicina ocidental baseada na ciência.
    No começo do século vinte as agulhas se cravavam perto de onde doía, sendo um francês (Soulié de Morant) a utilizar por primeira vez a palavra “meridiano” e a associar o tal de “chi” com energia em 1939.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Uma breve historia da acupuntura.
    O ser humano conseguiu produzir agulhas tão finas de aço, como as usadas na acupuntura, há aproximadamente quatrocentos anos, ou seja, a acupuntura no estado atual é moderna. Anteriormente eram usadas agulhas grosas e ao principio pedras e até lanças.
    O livro mais antigo que descreve a acupuntura é: “Princípios da medicina interna do imperador amarelo” de Huangdi Neijing do ano 100 e.c..
    Segundo Paul Unschuld, sinófilo historiador, a idéia de acupuntura poderia ter-se originado na Grécia Hipocrática e haver sido importada para China mais tarde, ou seja, se Hipócrates morre aproximadamente no ano 370 a.e.c., a acupuntura não tem mais de três mil anos, nem é chinesa. (Paul Unschuld, sócio fundador de Horst-Goertz-intitute, de teoria, historia e ética de ciências da vida chinesa, Universidade de Medicina de Berlim)
    Um artigo de revista científica afirma que a ausência de qualquer menção de acupuntura em documentos encontrados na tumba de Ma-Wang-Dui de 198 a.e.c., sugere que a acupuntura não foi praticada neste tempo. (White, A.; Ernst, E. (2004). "A brief history of acupuncture". Rheumatology, Oxford, Inglaterra )
    Em 1683, um médico holandês, descreve à acupuntura sem nomear pontos específicos e comenta sobre grandes agulhas que se cravam no crânio e são deixadas aí durante trinta respirações. ( Willelm tem Rhijn, Dutch East India Company [Compania da Indias Orientais], ensaio "De acupuntura “, em latim). Nesta época começa a se falar em acupuntura no occidente.
    Em 1757, na china, a acupuntura é determinada como “arte perdida”, declínio este determinado pela popularidade de prescrições médicas e medicamentos e por ser associado às classes mais baixas. (Gwei-Djen Lu; Joseph Needham. Celestial Lancets: A History and Rationale of Acupuncture and Moxa, October 25, 2002).
    Em 1822, o imperador chinês assinou um decreto excluindo a prática da acupuntura do Instituto Médico Imperial alegando impróprio para cavalheiros eruditos. (White, A.; Ernst, E. (2004). "A brief history of acupuncture". Rheumatology, Oxford, Inglaterra )
    Na China foi considerada cada vez mais associada à classe baixa e analfabeta, onde foi banida em 1929 em favor da medicina ocidental baseada na ciência.

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  6. No começo do século vinte as agulhas se cravavam perto de onde doía, sendo um francês (Soulié de Morant) a utilizar por primeira vez a palavra “meridiano” e a associar o tal de “chi” com energia em 1939.
    A acupuntura no pavilhão da orelha foi criada por um médico francês em 1951 (Dr. Paul Nogier). Neste caso os médicos chineses “tomaram” a idéia e em 1972, a Unidade de Pesquisas do Exercito do Povo, publicou o primeiro livro especializado como o Mapa Chinês com 200 pontos auriculares. Digamos que não é tampouco milenar nem chines. (http://www.centrobrasileiro.com.br/biblioteca/01/data/Auriculoterapia.pdf).
    Em 1949 o líder Mao Tse-Tung, tomando o poder, procurou unir a China com os valores culturais tradicionais. Sendo nesta época que começa o ressurgimento da prática de esta “arte”. Aliás, ele nunca a utilizou, sendo mais para o povão já que apesar de ser comunista não tem SUS por lá.
    Hoje na China, temos o Conselho de Medicina Chinesa, que fora determinado pelo Conselho Legislativo em 1999, que regula a sua utilização, já que não pode ser qualquer um que pode ganhar dinheiro com esta farsa.
    Uma vantagem que temos é a de poder escolher entre nove ou onze meridianos , 360 ou 2000 pontos, acupuntura chinesa, japonesa, coreana, indiana ou francesa. Em detrimento da Medicina Científica que no mundo todo é uma só.
    Agora, algum efeito deve ter, até para os céticos, depois de tudo estamos sendo espetados. O Dr. Edzard Ernst, catedrático de medicina e nomeado professor de medicina complementaria da Universidade de Exter, fala sobre o “flagelo da medicina alternativa”, já que estudos demonstram que “em 45 anos a acupuntura causou ao menos 86 mortes (constatadas), por causa de agulhadas incorretas e involuntárias no coração e nos pulmões, bem como por danos em artérias e fígado, problemas nervosos, choques, infecções provocadas pela ausência de esterilização, hemorragias, etc.. sendo esta informação, a ponta do iceberg “. “a causa mais comum de morte foi a pneumotórax”.
    Abraços e obrigado ...

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